sexta-feira, 12 de maio de 2017

MULHERES QUE CONHECI




A preservação de seu nome.
A integridade de sua família,
e de outras vidas.
Majestosas, espiritualizadas,
curadoras e visionárias.
Mulheres pioneiras de Sinop.
As que já escrevi.
E as que escreverei.
Um pós doutorado.
Mais que Harvard.
Mais que volta ao mundo.
Suas vidas, suas histórias.
A feminilidade da guerreira,
a ferocidade da mãe,
a singeleza da alma humana,
a delicadeza do amor,
a beleza de uma flor,
a força da natureza,
a grandiosidade da mulher.
Mais de mil palavras não bastam
para dizer o tudo
de todos os dias
das rainhas
mulheres pioneiras
de Sinop.
Amamos vocês!
Leni, 8 de março de 2017

APRESENTAÇÃO



Entre as ESTRELAS IMORTAIS, há o BRILHO DE minha mãe, Maria Paula, com carinho especial; da Dona Nilza de Oliveira Pipino, esposa do colonizador; e de sessenta e duas pioneiras de Sinop, Mato Grosso. Mulheres guerreiras, batalhadoras, fortes, determinadas, amorosas, dedicadas, felizes!
Escrever O BRILHO DE ESTRELAS IMORTAIS – Volume II, dando continuidade à proposta iniciada em Nova Mutum, também Mato Grosso, é dar continuidade à alegria e ao privilégio de ter pessoas maravilhosas compondo as páginas do livro da minha vida, e também de olhar a história de vida de mamãe a partir do seu relato.

Sou grata aos meus pais, Maria Paula Taufer Chiarello e Erzelino Chiarello, pela vida, pelas providências e pelos ensinamentos. Juntos, são referência para muitos passos que dei e darei na vida.
Sou grata a cada uma das mulheres de Sinop, por terem me recebido em seus lares, com carinho e acolhida. Grata por confiarem as histórias de suas vidas que, organizadas para esse registro, se tornaram, cada uma, referências para meu aperfeiçoamento pessoal.

No início da proposta, há dois anos, optando pela temática pioneirismo, pensei em entrevistar mulheres que chegaram a Sinop entre os anos de 1970 a 1985. Iniciados os trabalhos, constatei que as pioneiras, na sua grande maioria, graças a Deus, estão vivas, e o livro se daria no mínimo com mil páginas. Isso é bom. É muito bom.

Contudo, para que o projeto fosse exequível, optei por reduzir a pesquisa entre os anos de 1970 e 1980. Ainda assim, além das sessenta e duas que aqui estão, um número considerável de mulheres que chegaram nesse período não foram contempladas nessa obra. Por isso, fica o encaminhamento para que se produza o Volume III do BRILHO DE ESTRELAS IMORTAIS, ainda em Sinop.

Dia vinte e quatro de junho de 2015, na casa da Dona Anízia Mendes Gobbo, foi o momento em que iniciei os trabalhos. Professora Anízia, aposentada e conhecida por todas as famílias pioneiras de Sinop, se propôs a ajudar; e como ajudou! Disse ela, um dia, com brilho nos olhos: “voltei a trabalhar”. Anízia, grande amiga, muito obrigada.

Por meio do nome dela, registro minha gratidão a todos que contribuíram com esta obra. Plural, porque foi escrita a várias mãos; estas, guiadas por mentes e corações elevados. Entregamos ao leitor nossa história que, revivida ao contá-la, proporcionou momentos de fortes emoções. Ao digitalizar fotografias das vivências de cada uma, às madrugadas, eu imaginava aquele mundo, aquela época, aquela menina, aquela jovem, hoje mulher, que hoje se diz feliz, realizada. Eu imaginava detalhes, sentimentos, de outros tempos, de outras pessoas, de outros lugares, de Sinop iniciando, de Sinop crescendo, de Sinop se agigantando. Momentos meus, ímpares, sentindo a VIDA em uma fotografia. Inexplicável!

Vindo do Rio Grande do Sul, ao chegar a Mato Grosso para morar, acompanhando a trajetória de filhos que provocamos voar, eu disse que viver a experiência do Mato Grosso foi mais do que cursar as disciplinas de um curso de doutorado. Registrar a história dessas sessenta e duas mulheres pioneiras de Sinop, assim como a de mamãe, afirmo que é mais do que escrever a tese de um curso de doutorado.

A aprendizagem é significativa e construtiva. A evolução enquanto pessoa e profissional é grande. Gratidão é o que manifesta, portanto, meu coração.

Sou escritora por vocação e não por formação, como disse o filósofo Platão, e minha veia literária até então era a poesia. Por isso, a presença dela é fato. Defini-la? Alguém poderá? A mim, escrevê-la basta. Para mim, escrever é viver! Escrevo na sinceridade da alma com base na filosofia da vida.

Para quem dispõem de tempo para pesquisar, seja pela própria pesquisa, por amor ou gosto à atividade, para conhecimento e enriquecimento pessoal, pode investigar a trajetória humana e constatar que as pessoas, homens e mulheres, excluídas da sociedade e/ou eliminadas desse mundo por meio da própria ação humana, são escritas, na literatura ou mesmo na história, como “pessoas à frente de sua época”, e passam a ser admiradas por gerações há séculos de distância, sem o devido merecimento enquanto vidas terrenas.

No universo feminino a batalha é mais árdua, uma vez que, culturalmente, a autonomia da mulher se dá pelo maior valor social, o econômico, ou seja, se ela for rica, sua família representa amparo social e moral. Do contrário, ela vivencia as mais vis situações até, corajosamente, conquistar sua liberdade, sua autonomia, sua igualdade enquanto pessoa, independente de gênero.

Propõem-se, aqui, portanto, observar e analisar com amor os processos humanos, considerando cada ser como “criatura”, para trilharmos o caminho da evolução com sabedoria, justiça e humanidade.

Interessante a analogia das “Mulheres de Atenas” e a cultura grega, com Iracema de José de Alencar, virgem América e mulher, e Martim, colonizador e homem. Moacir é filho, é Sinop hoje. Quem morre? O que morre? Por que morre? O que vive? Quem vive? Por que vive? Os registros, pelo olhar de quem? Epistemologia da evolução humana.

Se no tempo de José de Alencar a sociedade ainda privilegiava o homem, sua literatura foi capaz de moldar a realidade daquele tempo na forma da figura feminina, abordando a situação social e familiar da mulher, em face do casamento e do amor, mesmo que na mentalidade romântica da época, um amor sublimado, idealizado, capaz de renúncias, de sacrifícios, de heroísmos e até de crimes, se redimia pela força de sua intensidade e de sua paixão. As razões do coração, uma característica marcante da mulher, e que transitou e transita entre a Senhora e/ou a Lucíola. Ainda temos caminho pela frente.

Encontramos ainda ressonância na Amélia, de Mario Lago, mas ela evoluiu. Diante de muitas lutas, nota-se que a mulher do século atual conquistou mais autonomia e mais participação ativa na sociedade, traços que já encontrávamos no Romantismo de José de Alencar. Poetas, romancistas, artista, contribuindo para a sociedade humana justa, igualitária.

Na literatura e no dia a dia, a mulher passou a refletir e questionar seu papel dentro da sociedade, dentro de suas casas e de seus casamentos. A produção literária a mãos femininas a partir do século XX, teve o papel de desestabilizar a legitimidade tradicional da mulher, que era de “se não anjo do lar”, “impura” e “imoral”. Reestrutura-se, com a contribuição da literatura de autoria feminina, própria identidade da mulher, em seus desejos, ambições e trajetórias.

Nos últimos dez anos, o Nobel de Literatura quadruplicou o número de mulheres premiadas – um panorama que busca não apenas refletir os avanços sociais nesse período, mas também contribuir com eles. A escritora Lygia Fagundes Telles é a primeira brasileira indicada ao Prêmio Nobel da Literatura, em 2016, aos noventa e dois anos. Porém, Bob Dylan foi o vencedor do Prêmio Nobel da literatura daquele ano; o músico folk de 75 anos, norte-americano, foi o primeiro cantor a receber a distinção; também quebrando paradigmas. Mas, antes disso, o primeiro escritor latino-americano a receber o Prêmio Nobel de Literatura foi mulher, em 1945, a escritora chilena Gabriela Mistral.

Não há necessidade de argumentos ao fato de Selma Lagerlöf não ser tão conhecida quanto os Irmãos Grimm e Miguel de Cervantes. Ser mulher, porém, não a impediu de receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1909. Primeira mulher a receber tal honraria, além de primeira mulher a entrar na Academia Sueca, em 1914. Sem dúvidas, uma garota à frente de seu tempo.

E por falar nisso, cada depoimento registrado aqui traduz desejos, ambições e trajetórias de mulheres “à frente de seu tempo”. Aplaudamos em tempo. Em tempo de lhes reconhecer o devido valor e contribuição à sociedade. Iracemas e seus Moacir, com reconhecimento, gratidão e construção ao lado de seus Martins, sem necessidade de mortes, de mares, de diferenças. Superação pautada na coragem de vencer cada desafio, material, pessoal, cultural. Mulheres sinopenses que deram asas a si mesmas e incentivaram o voo de outras mulheres.

Para estas mulheres, que não perderam a sua natureza feminina de abrir mão do cômodo para serem belas, como usar um salto alto, fazer uma depilação à cera quente, ou luzes no cabelo e na pele, que lhe custam o mês de trabalho, viverem boa parte da sua história em um lugar como era Sinop em 1972, foi tão natural quanto. Essa é a sabedoria humana, sem necessidade de ser obrigatoriamente privilégio do universo feminino.

Uma nova e positiva versão para contos de fadas, nos quais as madrastas são boas, os pais viúvos assumem seus filhos e as meia irmãs são mais que amigas. E, como os saltos altos, os sentimentos dessas e outras mulheres tendem também para o céu, ou seja, importa pouco a aparência física de uma pessoa, se ela é honesta e gentil, ou se é frágil e desprotegida, e necessita de proteção. Isso vale para animais, para plantas. À mulher, a vida é um bem raro, que sai dela em forma de outra pessoa e de amor.

A força e a objetividade masculina para as tarefas prática completam a sabedoria feminina de mergulhar no mundo mental com objetividade e prática, buscando a solução para o que precisa resolver.

Naturalmente é ponto de encontro, de harmonia e de união. O que fortaleceu essas guerreiras para que elas superassem o árido do desbravamento? Não seria o que, mais uma vez a literatura descreve no personagem Lancelot, da saga Rei Artur? Um coração idealista, nobre, a serviço de uma causa humana, maior do que sua própria e simples existência material! São fadas de asas, protetoras e, ao mesmo tempo, preparadas para voos, com seus protegidos e protetores.

A luta das mulheres não é contra os homens. E sim, em busca de um mundo onde todos, independentemente de gênero, tenham direitos iguais. Mulher é diferente de homem, física e psicologicamente.

A luta não é para ser igual aos homens. É para um mundo onde o fato de ser mulher, para muitas, não mais seja uma sentença de morte; é por um mundo em que as mulheres tenham os mesmos direitos que os homens.

Nesse ano de 2017, tive a grande honra e a graça de entrar para a Academia Sinopense de Ciências e Letras, ocupando a cadeira vinte e cinco, cujo patrono é o escritor gaúcho Érico Veríssimo, que integrou o movimento modernista iniciado em 1922 com a Semana da Arte Moderna. Apesar da época, anos trinta e quarenta, em que as mulheres não possuíam voz nem expressão, Érico compôs um grupo de personagens femininas capazes de lutar por seus ideais, pela subsistência e pela felicidade, diante de situações adversas, que as obrigam a caminhar rumo as suas aspirações e necessidades, econômicas ou afetivas.

A representação da mulher na obra de Erico Veríssimo aparece despida de caricaturas e clichês, sinalizando para a mudança que principiava a ocorrer, pois as mulheres estavam sendo inseridas no mercado de trabalho por meio da docência, como a personagem Clarissa, e da questão das jovens que ousavam se aventurar pelas ruas desacompanhadas, frequentando as festas da sociedade local, como a personagem Chinita. Esses fatores do limiar da emancipação feminina são perceptíveis no relato das mulheres quando chegaram a Sinop.

Percebe-se nos depoimentos que, o fato de ser mulher, apesar de muito jovem e sem estudos suficientes, já se candidatava para exercerem o papel de professora na comunidade. Clarissa, de Érico Veríssimo nos anos trinta e quarenta; e as jovens pioneiras em Sinop nos anos setenta e oitenta, unidas pelo processo de feminização da categoria e pela participação da mulher nos processos migratórios em funções que dizem respeito ao ser humano. A humanização pela ação da mulher.

A necessidade de professores em regiões de desbravamento fez com que mulheres migrantes tomassem a decisão de trabalharem na escola, apesar de temerem não serem suficientemente capazes, por falta de formação adequada. Diferentemente de Clarissa, que se preparou para isso e, a ela, foi a valiosa moeda de troca quando precisou sobreviver em ambiente agressivo e acelerado ao deixar o interior para viver num grande centro urbano.

Tanto os depoimentos das mulheres pioneiras de Sinop quanto as pesquisas, mostram que as profissões ligadas à educação, ao cuidado ao doente e à assistência social eram ocupadas por mulheres, enquanto que os trabalhos de gestão, contabilidade, engenharia, medicina, por exemplo, eram desempenhados por homens.

Clarissa e as pioneiras de Sinop mostraram a mulher despojada, que enfrentou situações adversas como a pouca idade e, algumas, a resistência do marido em vê-las ocupando um cargo no espaço público. Uma importante contribuição para a evolução dos processos sociais na perspectiva da igualdade de direitos, de espaços, de tratamentos, de oportunidades. É por tudo isso que hoje podemos olhar para mulheres como a jurista, ministra e vice-presidente do Superior Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia; a médica Adriana de Oliveira Melo, Maria da Penha, e tantas outras.

Em O BRILHO DE ESTRELAS IMORTAIS, Volume I, listei mulheres que merecem minha referência. Nesse volume II, sugiro que conheçam a história de Elise Meitner. Penso que é uma referência interessante para compreendermos a sociedade humana e contribuir para que ela evolua no sentido do amor, da humanidade. “[...] A Guerra... Lise ficou seriamente deprimida. [...]”

Para quem prefere um debate filosófico, proponho o “Círculo de Viena” e a Filosofia de oitocentos anos antes de Cristo, que mostra que a Filosofia desde sua origem pertenceu ao gênero humano. Boas reflexões propõe essa mesa.
Loucura? Todos temos um pouco? Adjetivo aos artistas? Pois seu tratamento, literalmente falando, avesso ao humanismo, foi revolucionado no Brasil, por uma mulher. Nise da Silveira. Você sabe quem é? Caro leitor, proponho também que dedique um tempinho para conhecer seu trabalho.

Para a literatura e suas mulheres; para a vida e suas mulheres; há necessidade de muitas laudas. Deixo prevalecer o BRILHO das sessenta e duas ESTRELAS IMORTAIS de Sinop e de minha querida mamãe para que as Academias discorram sobre, e, quiçá, nelas, identifiquem o perfil da mulher na segunda metade do século XX, bem como sua contribuição para as importantes conquistas dos direitos iguais para homens e mulheres que somos. Como disse Rosa de Luxemburgo, a contribuição da mulher por um mundo onde sejamos “socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”.

Cada depoimento aqui apresentado é a tradução dos anos de trabalho de mulheres que desafiaram seus tempos, fazendo valer suas vontades em épocas em que a voz de seus pais e maridos prevalecia. Essas sinopenses, cheias de coragem e força, transformam suas palavras em inspiração e encaminhamentos às futuras gerações, e provam que qualquer dificuldade é superada quando a vontade de vencer é maior que o medo dos desafios e o amor é maior que tudo.


Leni, 2017





PRÓLOGO


Um novo espelho que reflete o brilho partilhado da nossa transcendência No primeiro volume “O Brilho de Estrelas Imortais”, a escritora Leni Chiarello Ziliotto fez refletir em forma magistral como num espelho os sonhos e as frustrações, as alegrias e as tristezas, as fortalezas e as debilidades, a coragem e os medos das mulheres pioneiras de Nova Mutum, em Mato Grosso.

O segundo volume de “O Brilho de Estrelas Imortais”, escrito por Leni, reflete com nova claridade a luz das motivações e frustrações, os sonhos e a realidade, os obstáculos e as conquistas, as dificuldades e a persistência que marcaram a vida das mulheres pioneiras de outra cidade do Mato Grosso: Sinop.

Este “segundo espelho” de “O Brilho das Estrelas Imortais” revela o fulgor da coragem e persistência com a qual as mulheres pioneiras de Sinop deixaram suas famílias e cidades de origem, com saudades e lágrimas, e ao mesmo tempo com esperança e a utopia de um futuro melhor para elas e suas famílias. Na leitura das histórias de vida destas mulheres pioneiras de Sinop brilham claramente alguns elementos constantes do espírito de superação e busca de transcendência das dificuldades circunstanciais da própria vida e para encontrar a motivação e o sentido da própria vida. 

Neste sentido, a confiança nas próprias capacidades de superação das dificuldades e a fé na presença de Deus acompanhando suas vidas são elementos que brilham constantemente em suas histórias de vida. O brilho interior e o brilho de Deus as animaram a “sair chorando para o que der vier” e a “resistir, enfrentar, aguentar, encarar com coragem” as aventuras e peripécias de chegar a um lugar sem infraestrutura para reiniciar a própria vida e construir uma cidade próspera neste lugar. “Nossa fé era tão grande que só ela explicaria como passamos por tudo isso”, revela uma das “Estrelas Imortais”.

O brilho da participação das mulheres no processo de construção da cidade de Sinop também revela o papel determinante delas na família e no desenvolvimento social da cidade, como revelam os exemplos destas três mulheres: “Acredito que para as famílias que chegaram no começo, num tempo em que aqui não havia quase nada além de mato e trabalho, a mulher que concordou em ficar foi a que segurou o homem por aqui e possibilitou a construção da cidade. Homens fazem grandes obras, mas sempre através do apoio, equilíbrio e presença da mulher”; “O que tínhamos de mais rico era nossa união familiar, que nos fazia levantar a cabeça e superar aquelas tantas dificuldades e perigos”; “Todas guerreiras, envolviam-se de corpo e alma nos trabalhos sociais, nos trabalhos normais, ou em ser o alicerce da família... Penso que a nossa contribuição é grandiosa, pois participamos da construção da sociedade sinopense oferecendo valores e virtudes,” trabalhando incansavelmente e em forma solidaria.

O brilho do pioneirismo das mulheres se reflete em tantas outras áreas do desenvolvimento da cidade de Sinop, destacando-se as áreas da educação, da saúde, dos programas sociais, na gestão de entidades privadas e públicas e nas áreas de serviços e comércio. Estes são apenas alguns dos inúmeros reflexos do brilho destas mulheres pioneiras de Sinop que a leitora e o leitor poderão contemplar ao ler este segundo volume de “O Brilho de Estrelas Imortais” Boa leitura!

Leonir Mario Chiarello
Diretor Executivo - Scalabrini International Migration Network
New York, Março de 2017






PREFÁCIO



Sinop e suas mulheres pioneiras uma historia de trabalho, coragem, persistência, amor e muita fé.

O olhar aguçado da autora e a bela narrativa das histórias de vida das mulheres “pioneiras” revelam o passado e o presente de Sinop de uma forma original nesta obra. 

As chamadas mulheres pioneiras fazem parte dos muitos sulistas, paulistas e outras regiões do Brasil que na década de 1970 vieram ocupar as “terras de ninguém” no Mato Grosso. 

Muitos voltaram, mas elas fazem parte dos muitos que resistiram, ficaram e construíram um dos atuais grandes centros agropecuários do Brasil. O Centro-Oeste, de rápido crescimento populacional e econômico, que hoje conta com cidades como Sinop, Lucas do Rio Verde, Sorriso, Nova Mutum, somadas a Alta Floresta, Primavera do Leste, Campo Verde e outras que até 1975 eram pura mata e hoje se apresentam como potências econômicas.

Foram sessenta e dois testemunhos, de mulheres vindas de diferentes lugares e com histórias únicas de vida, mas unidas pela experiência de haverem compartilhado da construção de Sinop desde suas origens. 

Neste processo, os relatos revelam também muitas qualidades em comum: o estoicismo, persistência, altruísmo, dignidade, generosidade e religiosidade destas mulheres. 

Uma pergunta que emerge seria, o porquê do sacrifício destas mulheres, muitas das quais deixaram suas famílias de origem, trabalho profissional, e um relativo conforto, para se aventurarem no desbravamento da floresta, vivendo de forma precária, embaixo de lonas, sem eletricidade, água potável, mercados e outros benefícios da cidade.

Afinal, qual seria o objetivo de tudo isto? 
Novas aventuras? 
Projeto familiar? 
Garantia de um futuro melhor para os filhos? 
Mobilidade social e econômica? 
Sonho da terra e casa própria? 
Necessidades e luta pela sobrevivência? 

Os relatos mostram que os motivos dessas mulheres pioneiras, para enfrentarem com suas famílias a colonização de Sinop, não pode ser reduzido a um ou dois dos fatores mencionados. 

As histórias de suas numerosas famílias de origem, o projeto da sua família de procriação, bem como os sonhos de uma vida melhor para os filhos, pareceriam assumir a prioridade entre as razões para vir colonizar Sinop. 

Entretanto, a narrativa e diversidade das experiências aponta para uma complexidade ainda maior de razões, onde interagem fatores de ordem histórica, temporal e espacial importantes. 

Os fatores de ordem pessoal, familiar, sócio econômico e mesmo religiosos justificariam o sacrifícios do desbravamento de novas terras bem como e a história de perdas e logros alcançados. 

Isto incluiu acidentes e perdas de entes queridos, por falta de produtos e serviços médicos, mas também inclui muitos filhos bem sucedidos, com educação de nível superior e negócios próprios.

Oportunidades de liderança das mulheres na comunidade, com suporte efetivo de padres e freiras para reproduzirem seus valores de família e fé, bem como garantirem o projeto de educação dos filhos com a construção de igrejas e escolas.

Portanto, foram vários os motivos presentes na decisão das famílias, ou mais bem dos homens da família, ao responderam as ofertas atrativas do “eldorado”, pelas empresas colonizadoras. 

Os homens, maridos e filhos, foram primeiro visitar o Mato Grosso, compraram terras e depois levaram as mulheres e filhos, confiantes de que as companheiras mulheres seriam fundamentais para o sucesso do empreendimento. 

Estas não desapontaram, e foram mesmo figuras decisivas como as pioneiras relatam.

No processo de colonização de Sinop, as pioneiras demonstram que não existe uma separação entre as esferas do espaço público e privado. 

O público seria o espaço do mercado, do trabalho fora da casa, onde predominariam os homens, enquanto o espaço privado seria representado pela família e de domínio das mulheres. 

De fato, as mulheres pioneiras, ao enfrentarem lado a lado com seus maridos e filhos o desbravamento da floresta e todas outras atividades de construção de Sinop, desconstruíram também a visão tradicional da divisão das esferas pública/privada, e reinventaram os papeis de gênero, ou seja, o entendimento do que seria tarefa de homem e tarefa de mulher.

Ao dar voz e rosto às mulheres pioneiras de Sinop, Leni Chiarello Ziliotto nos oferece não só um livro bonito e original, mas documenta e revela um dos segredos do sucesso da nova colonização do Centro-Oeste: o papel das mulheres neste processo. 

A perspectiva das mulheres, implícita na obra se materializa na metodologia adotada, bem como nos relatos das práticas e discursos destas. Deixa claro a prevalência de um sistema de relações de gênero ainda bastante tradicional, mas também evidencia os avanços provocados e alcançados pelas mulheres pioneiras. 

Estas desafiaram visões e práticas conservadoras, contribuindo para desmistificar as relações de gênero e reafirmar, uma vez mais, a falsidade da divisão de trabalho entre as esferas pública e privada.

Nesse sentido, “O Brilho de Estrelas Imortais” traz uma contribuição fundamental tanto para a história de Sinop como para os estudos sobre mulheres e as relações de gênero no país, importante nesse momento histórico crucial, de riscos e retrocessos dos direitos e equidade de gênero conquistados nas últimas décadas.

Ana Maria Goldani
Doutora em Sociologia
Professora na UNICAMP, Campinas/ São Paulo;
Professora na Universidade da Califórnia Los Angeles (UCLA);
Professora na Princenton University, em New Jersey, Estados Unidos.









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