“O
professor é o indivíduo vocacionado a tirar outro indivíduo das trevas da ignorância,
da escuridão, para as luzes do conhecimento, dignificando-o como pessoa que
pensa e existe.”
As palavras acima são do juiz de
Direito Eliezer Siqueira de Sousa Junior, da 1ª vara Civil e Criminal de Tobias
Barreto/SE, ao julgar improcedente a ação de aluno em face de professor que
tomou seu celular em sala de aula.
De acordo com os autos, o docente
retirou o aparelho do aluno, que ouvia música com fones de ouvido durante sua
aula. O menor, representado por sua mãe, ajuizou ação para pleitear dano moral,
para representar seu “sentimento de impotência, revolta, além de um enorme desgaste
físico e emocional”.
Ao analisar o caso, o juiz Eliezer
solidarizou-se com a situação dos professores.
“Ensinar era um sacerdócio e uma
recompensa. Hoje parece um carma”.
Afirmou, então, que o aluno
descumpriu norma do Conselho Municipal de educação, que veda a utilização de
celular durante o horário de aula, além de desobedecer, reiteradamente, o
comando do professor.
Para o magistrado, não houve abalo
moral, uma vez que o aluno não utiliza o aparelho para trabalhar, estudar ou
qualquer outra atividade.
“Julgar procedente esta demanda é
desferir uma bofetada na reserva moral e educacional deste país, privilegiando
a alienação e a contra educação, as novelas, os realitys shows, a ostentação, o bullyng
intelectivo, o ócio improdutivo, enfim, toda a massa intelectivamente
improdutiva que vem assolando os lares do país, fazendo às vezes de educadores,
ensinando falsos valores e implodindo a educação brasileira.”
Por fim, o juiz prestou uma
homenagem aos docentes.
“No
país que virou as costas para a Educação e que faz apologia ao hedonismo
inconsequente, reverencio o verdadeiro herói nacional, que enfrenta todas as
intempéries para exercer seu “múnus” com altivez de caráter e senso sacerdotal:
o Professor.”
Processo
201385001520
Fonte:
http://www.nacaojuridica.com.br/2014/06/juiz-nega-dano-moral-aluno-que-teve.html
(Grifo
nosso)
A sala de aula ainda está no século 19
A pedagogia vê o professor como única fonte de saber e despreza novas
tecnologias
Desde 1995, ano em
que a internet se socializa e se põe à disposição de todo o mundo, as coisas
começaram a mudar na sociedade do final do século 20. Essas mudanças seguem
afetando substancialmente os conceitos tradicionais dos quais nos valíamos
desde o final do século 19. Com à internet ao alcance de todos e a novas
tecnologias ao alcance de quase todos, os conceitos tradicionais mudaram, ainda
que exista gente que se aferre ao antigo sem perceber que o passado não é capaz
de fazer frente aos desafios que temos diante de nós.
Qualquer conceito que
examinemos oferece uma nova imagem, radicalmente diferente da que havíamos
formado no imaginário coletivo durante séculos. A educação é um exemplo.
Fala-se e teoriza-se muito sobre o chamado fracasso escolar, apoiando-se em
relatórios para analisar o tal fracasso utilizando parâmetros da sociedade
industrial, desconhecendo que com a internet entramos numa nova sociedade.
Os relatórios
analisam resultados, mas evitam entrar nos conteúdos, instrumentos e atitudes
dos sistemas educativos. Todos sabem que, quando ocorre um acidente de
avião, a primeira providência é buscar e analisar a famosa caixa-preta, onde
estão todas as informações sobre o que aconteceu no momento do desastre. A
análise do sistema educativo deveria buscar e analisar a caixa-preta da
educação, a sala de aula.
O que nos diz essa
caixa-preta? Primeiro que a informação já não é fonte do poder e autoridade do
professor. Durante séculos o professor era o depositário da informação que ia
transmitindo, ano após ano, aos alunos, sem outro auxílio que não livros de
texto, lousa, giz e alguns poucos meios didáticos que o estudante só podia usar
em sala de aula.
O professor era o
xamã da tribo, sabia o que tinha de saber e transmitia isso da forma que podia
transmitir. Na aula se segue a mesma metodologia, depreciando a evidência de
que a informação já não é patrimônio do docente mas que, em grau superlativo,
está à disposição do aluno num aparelho que permite buscar em segundos tudo o
que é necessário saber.
A internet é um
magnífico instrumento. Libera informação em tal quantidade que o professor que
a menospreze ou pretenda competir com ela está deixando de exercer seu novo
papel, o de se converter em agente organizador capaz de fazer com que o aluno
saiba utilizar a rede para pescar o que precisa e para que a informação chegue
ao estudante em forma de conhecimento. Enquanto nos empenharmos em evitar
a nova realidade estaremos incidindo nos mesmos erros que se cometeram
historicamente, quando alguns sistemas educativos se empenhavam, por exemplo,
em amarrar a mão esquerda às costas dos alunos, obrigados a escrever com a mão
direita porque assim ditava a norma, mesmo que fossem canhotos.
O sistema demorou a
aceitar que o cérebro se organiza de forma diferente para destros e canhotos e
que era um atentado contra a natureza pretender que todos fossem
destros. Os alunos nascidos depois de 1995 são digitais, e só digitais.
Nasceram com as novas tecnologias e seu mundo não é analógico, por mais que o
sistema educativo se empenhe em vê-los como tais e anular a digitalização
durante a jornada escolar.
É de novo a mão presa
às costas para que sigam analógicos. Um adolescente de 12 ou 13 anos é digital
quando se encontra fora da aula e analógico quando se senta em sua carteira.
Essa contradição se choca com os interesses do aluno, impedindo que desenvolva
suas potencialidades, se aborrecendo diante de um sistema pedagógico inadequado
às regras e normas que tem em sua casa ou na rua. Alunos que fora do
período escolar têm a oportunidade de usar um computador para conectar-se ao
resto do planeta na escola se deparam com a limitação de uma parede adornada
com uma lousa que mata sua imaginação e sua capacidade de unir-se ao mundo.
Ninguém pode achar
estranho que o sistema fracasse. O argumento de muitos de que a educação sempre
foi assim é uma falácia que evita a responsabilidade de envolver-se com o
treinamento e uso de tecnologias que o aluno usa com naturalidade na rua e das
quais se vê privado nas aulas. Nenhum cidadão aceitaria que seu
diagnóstico fosse elaborado com o uso de antigos recursos da medicina quando a
ciência já oferece novas tecnologias que evitam erros de avaliação subjetiva.
Não existe médico que
dispense o uso de novas tecnologias em sua profissão. O médico se sente
responsável pela sorte de seu paciente e, em consequência, tudo que o ajude a
fazer um melhor diagnóstico será usado, independentemente de que os métodos
fossem diferentes ou de que em seus tempos de estudo tais tecnologias não
existissem. Ao contrário, estamos dispostos a seguir aceitando a velha
pedagogia que rejeita o novo, com o argumento de que sempre foi assim e assim é
que deve ser.
Juan Carlos Rodríguez Ibarra, El País (Fonte:
Revista da Semana 27/07/2008)
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